Trecho de um livro de Fernando Pessoa
"Ela era um misto de tudo o que sempre quis: Não tão
linda a ponto de me desconcertar, com um sorriso, ah! o sorriso:
claramente apaixonante, som na medida certa; seu olhar poderia ser
classificado como Olhar de Mangá²: duas belas jabuticabas cor de
azeviche; cabelos lisos e tão escuros como a asa da graúna³ a apontarem
para anatomia, calipígia; seios fartos (não sofro da obsessão
ítalo-estadunidense, mas achei por bem registrar) e uma voz, bem, se
Ulisses a ouvisse falar por mais que 5 minutos teria ele próprio se
livrado de suas amarras e nunca mais voltaria a ver Penélope. Mesmo tudo
isso não era o mais impressionante, impressiona-me até agora – e digo
isso sem bem entender o porquê de dizê-lo – foi apaixonar-me
perdidamente por ela em apenas uma noite. Sim, porque tudo o que disse
acima são reminiscências da noite, tatuagens que eu, anestesiado, sequer
percebi que tinham sido desenhadas e marcadas durante as horas em que,
num instante apenas conversávamos, noutro nos desejávamos loucamente.
Sábado estranho, não a amei a primeira vista, mas queria que assim
tivesse sido, como miticamente teria feito o cupido, talvez eu tenha me
impregnado de Bandeira e feito dela minha Teresa, mas não houve segunda
ou terceira vista, apenas a memória a me perturbar, a me dizer “Você fez
tudo errado, você é um mané, resigne-se, o tempo não volta!”. Não acho
que a memória tenha sido dura comigo, às vezes sou nefelibata demais.
Mereci o puxão de orelha.
[...]
Na
segunda-feira torci para que tudo não passasse de um sonho, mas não
fora, e na madrugada de terça pra quarta, embriagado, fiz questão de me
reafirmar enquanto bobo. O sonho não acabou, sequer tinha começado. Mas
foi eterno enquanto durou. Inesquecível. Amor com vista pro mar,
daqueles que você sente vontade de não acordar, apenas amar."
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dá um pitaco ae. e depois eu prometo q te mando ir à merda